As comunidades tradicionais pesqueiras vêm travando uma luta em
defesa da vida e pelo reconhecimento do território das águas. Na Área de
Proteção Ambiental do Delta do Parnaíba e em outros territórios do Brasil,
pescadoras e pescadores artesanais que vivem do extrativismo da pesca e de
outros extrativismos, ainda enfrentam, permanentemente, problemas
socioambientais relacionados à necropolítica, ou seja, às políticas de morte ao
território das águas e às políticas de supressão de direitos que afetam seus modos
de vida. O objetivo deste estudo é cartografar processos de subjetivação e
enunciação dos movimentos sociais de pescadoras e pescadores artesanais na luta
pelo reconhecimento do território tradicional pesqueiro. Método: Trata-se de um
estudo com o uso da cartografia como método e como modo de fazer pesquisa
qualitativa em psicologia e na composição do Movimento dos Pescadores e
Pescadoras artesanais - MPP a partir das cidades de Ilha Grande e Parnaíba,
Piauí, e do VI Grito da Pesca, realizado em Luziânia-GO. Para a produção das
informações realizamos participação observante em encontros, assembleia,
audiências, vistorias, vigilância socioambiental, oficinas, incidências e reuniões,
com registros em diários cartográficos; além de entrevistas com as lideranças dos
movimentos para construção de narrativas, e análise documental. Partimos dos
pressupostos teórico-metodológicos da cartografia para a esquizoanálise das
informações produzidas no campo pesquisa. Resultados: Os resultados da
cartografia e a esquizoanálise dos conflitos socioambientais mostram: a)
limitação do acesso ao trabalho artesanal, comprometendo a vida, devido
ameaças de perder moradia em função de grilagem de áreas aforadas e de
projetos de urbanização, empreendimentos eólicos, turísticos e de
resorts/hotéis/grandes pousadas; b) medo de instalação de offshore (parque eólico
no leito marinho) e de projetos de perfuração de poços para exploração e extração
de petróleo, que podem causar desastres ambientais, como o de derramamento de
petróleo cru que ocorreu em 2019; c) disputas internas e tensionamento político e
o papel da Articulação Nacional das Pescadoras, na ruptura com a estrutura
patriarcal e de colonialidade, que marcam o surgimento do MPP; d) nas
comunidades pesqueiras, as mulheres, pescadoras artesanais, protagonizam a luta
a partir do próprio corpo-território-de-existência, luta por reconhecimento da
identidade pescadora artesanal, paridade e relacionalidade de gênero nos
processos instituídos por associações e sindicatos existentes e outras instituições;
e) a construção compartilhada de projetos democráticos, populares e
emancipadores em saúde de pescadoras e pescadores artesanais a partir da organização social em movimentos sociais pesqueiros como a ANP e MPP; f) uma aposta ecosófica na Demarcação do Território Pesqueiro através do Projeto de Lei 131/2021. Considerações Finais: No embate frente as investidas do capitalismo mundial integrado, as subjetividades de pescadores artesanais, ora sofrem agenciamentos aos modos de empreender sobre o uso da terra, do ar e das águas anunciados pela exploração das empresas estrangeiras, ora produzem resistências frente aos empreendimentos econômicos e energéticos – como corte de cercas acordos com guardas para trânsito no território cercado, organização de movimentos sócio-políticos, realização de audiências e incidências, dentre outros processos. As pescadoras e os pescadores artesanais operam, social e politicamente, no tensionamento dos movimentos sociais pesqueiros não só em prol de seus direitos, mas também em defesa da vida de humanos e não humanos no território das águas.