A vivência de experiências da, à época, aspirante à cartógrafa, junto à população em situação de rua, gerou inquietações, principalmente ao perceber o quanto os atravessamentos macropolítico e micropolítico nos tornam operadores de mortificações de corpos, numa lógica na qual as relações de poder social e político determinam como alguns sujeitos devem viver ou morrer. A população em situação de rua é constituída por uma heterogeneidade de contextos e sujeitos invisibilizados, com histórias e modos de vida singulares que por diversos vieses se deparam a viver em espaços públicos, onde, cotidianamente, sofrem violência e violações de direitos. Essa invisibilidade, ora apresenta-se como expressão de violência e negação operadas pelo processo do capitalismo, ora é utilizada como estratégia de resistência a esse sistema pelos movimentos das ruas. Os agenciamentos coletivos dos processos de subjetivação apontam para uma multiplicidade de movimentos, alguns segmentados, outros maleáveis e até singulares, resultantes de um entrelace de componentes de subjetivação que partem de domínios do corpo, dos grupos, do inconsciente, e das relações de poder, expressando, principalmente, regimes da produção de subjetividade capitalística. Embasados nessa premissa, objetivamos cartografar processos de subjetivação e enunciação dos modos de viver de pessoas em situação de rua a partir dos movimentos das ruas e dos agenciamentos dessa produção de subjetividades; identificar dispositivos que emergem desses processos de subjetivação, a partir da vivencia da condição de encontrar-se em situação de rua, e analisar modos de sujeição e resistência nos movimentos das ruas frente aos agenciamentos da produção de subjetividades de pessoas em situação de rua. Para tal fim, utilizamos como modo de fazer pesquisa-intervenção a cartografia, norteada por ferramentas-conceitos que nos possibilitam fazer a problematização dos agenciamentos dos processos de subjetivação e o mapeamento dos modos de vida das pessoas em situação de rua. A composição desses movimentos das ruas dar-se- á em cinco espaços públicos e no Centro de Referência Especializado para Pessoas em Situação de Rua. A entrada em campo deu-se com uma oficina de Educação em Saúde da População em Situação de Rua no VI Encontro Nacional de Educação Popular em Saúde e um encontro junto a População em Situação de Rua no Centro Pop com a presença do representante do Movimento Nacional da Pop Rua, Ivanilson Torres. Esse encontro mostrou-nos que a informação sobre direitos e possibilidades de mudança de condição de vida será nossa aliada, nessa trajetória, principalmente a partir do momento que essas pessoas possam reconhecer sua potência de vida e movimentação nesses espaços. Assim, nossa análise será feita a partir do estudo das linhas de força que compõem os movimentos das ruas e os dispositivos que emergem dos processos de subjetivação e enunciação dos modos de viver em situação de rua. Nossa intenção é evidenciar a configuração própria de cada espaço e os movimentos de resistência da população em situação de rua frente aos agenciamentos capitalísticos, apostando no agenciamento coletivo do desejo de produzir singularizações e modos de vida mais vivíveis. |