AGRICULTURA FAMILIAR E A (DES) (RE) TERRITORIALIZAÇÃO PROVOCADA PELO AGRONEGÓCIO NO CERRADO PIAUIENSE: HIBRIDISMO SOCIOCULTURAL EM URUÇUÍ
Agricultura empresarial, Agricultura familiar, Fronteira, Modos de vida, Território.
Recentemente, a expansão da fronteira agrícola no cerrado piauiense, comandada pelo agronegócio, que se caracteriza como um projeto sociopolítico organizado em torno de elites agrárias que defendem a presença atuante do Estado na concessão e proteção de benesses de um segmento social que produz para o mercado de commodities, articulado às exigências do capital financeiro internacional, consubstancia-se como o fenômeno responsável por transformações socioespaciais que atingem diretamente os modos de vida do agricultor familiar, o qual consiste em um ator social calcado nas virtudes da sociedade camponesa, cuja tradicionalidade legitima-se como uma particularidade que não esgota ante as rugosidades espaço/temporal. Nesse sentido, faz-se necessário investigar Uruçuí, em virtude da atividade agrícola familiar no município anteceder o agronegócio, por ter sido um dos primeiros a abrigar empreendimentos graníferos e a disponibilizar infraestrutura para o agronegócio e liderar o ranking de municípios com o melhor PIB per capita – desempenho decorrente do Valor Adicionado (VA) da agropecuária. Sendo assim, a questão norteadora da investigação conforma-se em como se manifesta a interferência da agricultura empresarial sobre os modos de vida dos agricultores familiares? Com vistas responder essa problemática, tem-se como hipótese a concepção de que a expansão do agronegócio em Uruçuí, por meio do planejamento produtivo e do gerenciamento, que inclui o uso sistemático de inovações tecnológicas e redução da força de trabalho, repercutiu em alterações nos modos de vida dos agricultores familiares, redundando na reconversão dos saberes, objetos e técnicas para reinseri-los em novas condições de produção e de consumo que se traduzem no hibridismo do tradicional com o moderno. E como objetivo geral a análise do processo de (des) (re) territorialização provocado pela agricultura empresarial nos modos de vida dos agricultores familiares de Uruçuí. Para tanto, especificamente, debateu-se teórica e conceitualmente agronegócio, agricultura familiar, modos de vida e território; contextualizou-se os fatores inerentes à expansão da agricultura empresarial em Uruçuí; caracterizou-se a agricultura familiar uruçuiense nas dimensões sociais, econômicas, culturais e ambientais; identificou-se na agricultura familiar influências do modelo empresarial de agricultura em larga escala; e discutiu-se as implicações do agronegócio na reprodução da agricultura familiar do município. A metodologia desse estudo qualiquantitativo sustentou-se nos métodos dialético, histórico, comparativo e etnogeográfico. Já os procedimentos técnicos, basearam-se nas pesquisas bibliográfica, documental e levantamento, como também na aplicação de formulários e entrevistas semiestruturadas entre 254 agricultores familiares, três fazendeiros, uma sindicalista, um gestor público e um técnico extensionista. Após a análise dos resultados, conclui-se que a instalação do agronegócio em Uruçuí foi condicionada por fatores como baixo preço da terra, infraestrutura, favorabilidades de clima, solo, topografia e hidrografia, e pela existência de um atrativo mercado consumidor regional. E que o contato dos agricultores familiares com o agronegócio, acarretou processos socioculturais de hibridação, marcados por uma eficácia performativa restrita, devido às limitações de assistência técnica, crédito, terras e da precariedade dos objetos tecnoprodutivos empregados nas roças, e caracterizados por um patrimônio de saberes e práticas tradicionais que não negava a modernidade, o que confirmou a hipótese, e ao mesmo tempo, expressou a necessidade de ações e intervenções públicas efetivas, visando a emancipação e potencialização da pequena produção no município.