CARACTERIZAÇÃO MORFOLÓGICA DO CAJUÍ (Anacardium microcarpum Ducke) DO LITORAL PIAUIENSE
Anacardium occidentale, Anacardium microcarpum, caju, cajuí, morfometria, taxonomia.
A. microcarpum Ducke, conhecida popularmente como cajuí, caracteriza-se pelo hábito arbóreo, folha simples, flores pequenas e perfumadas dispostas em panícula e, sobretudo, pelo fruto e hipocarpo de tamanhos diminutos que o diferencia notoriamente do seu parente mais próximo, A. occidentale, o caju. O cajuizeiro é uma planta nativa do Nordeste brasileiro que ocorre nos cerrados e tabuleiros litorâneos dos estados do Piauí, Ceará, Maranhão e Rio Grande do Norte. Apesar da inexpressividade econômica, tanto pelo fato de não ser cultivado e pelo pequeno tamanho, o cajuí desempenha papel sócio-econômico muito importante nos seus locais de ocorrência. Para alguns autores A. microcarpum trata-se de um táxon distinto de A. occidentale, enquanto que para outros, o cajuí é sinônimo de A. occidentale, gerando controvérsia quanto a taxonomia do grupo. Apesar da grande importância econômica de A. occidentale, não há nenhum estudo sobre a classificação infraespecífica da espécie e estudos que demonstrem claras diferenças entre caju e cajuí, a não ser pelo tamanho do fruto e do hipocarpo. Estudos mais confiáveis baseados em observações de folhas ajudariam na identificação do cajuí em períodos de ausência de frutificação, além de reforçar a noção de que o cajuí é realmente um táxon, talvez na categoria de subespécie, diferenciando-se, assim, do caju. Objetivou-se com o presente trabalho verificar o grau de separação entre os táxons do gênero Anacardium encontrados no litoral piauiense e chamados cajuí e caju, utilizando morfometria geométrica de folhas. Foram utilizadas amostras de 10 populações, cinco de caju e cinco de cajuí, 15 árvores amostradas em cada população, duas folhas de cada árvore, totalizando 300 folhas amostradas, no período de julho de 2012 a janeiro de 2014. A geometria da forma das folhas foi capturada usando 16 marcos anatomicos posicionados ao longo da margem foliar em pontos homólogos. As folhas foram fotografadas e importadas para o programa TpsDig (Rohlf, 2010) onde foram feitas as digitalizações das configurações dos marcos anatômicos. Todas as análises foram executadas utilizando o software PAST versão 2.17c (Hammer et al. 2001). As coordenadas originais capturadas em TpsDig foram normalizadas usando Análise Procrustes e a matriz resultante foi usada para as outras análises realizadas, as quais foram Análise de Componentes Principais (PCA), Variáveis Canônicas (CVA), Função Discriminante (DA), Coordenadas Principais (PCoA) e correlação da morfologia com a localização geográfica, através do teste Mantel. O PCA ilustra quais são as variáveis de forma mais importantes na amostra estudada. 95% da variância total da forma foliar pode ser expressada por 11 componentes principais (deformações), dos quais seis capturaram 88% da variância total. Destes seis deformações mais importantes, quatro tratam de variáveis simétricas, e duas de asimétricas. Comparação dos dois taxa usando DA encontrou uma diferença significativa entre as suas médias (Hotelling’s T2 = 67.99, F = 1.9037, p (igual) = 0.0034), mas apenas 68.33% dos indivíduos foram corretamente classificados. Em termos práticos, portanto, dado uma folha, não seria possível identificar o taxon com confiança. MANOVA e NPMANOVA (Análise de Variância Multivariada Não-Paramétrica) e uma validação cruzada “jacknife” mostraram resultados parecidos – diferença significativa entre médias dos taxa, mas grande superposição dos indivíduos, impossibilitando classificação confiável de um novo indivíduo. Comparação entre as dez populações foi realizada por usar CVA de uma matriz dos primeiros 11 componentes principais resultante da PCA. Aproximadamente 50% das comparações população-por-população foram significativamente diferente nos testes MANOVA, mas tanto entre populações do mesmo taxon como entre as de taxa diferentes. Um resultado parecido foi obtido usando NPMANOVA com distância Mahalanobis. A comparação de distância morfométrica com distância geográfica usando a teste Mantel mostrou ausência de correlação quando todas as dez populações foram usadas (R = 0.2886, p [igual] = 0.1766). Se os dados para Floriópolis e Cajueiro da Praia, as duas populações em que há mistura das duas espécies, forem deletados, porém, o resultado foi fracamente significativo: R = 0.5331, p [igual] = 0.0360. Os resultados mostram que há uma diferença estatisticamente significativa entre a forma das folhas de cajuí e caju, mas a variabilidade não permite classificação confiável usando somente a forma foliar. A comparação entre populações mostra diferenças até maiores do que as entre os dois taxa. A perspectiva para futuros estudos é de esperar uma complexidade de relacionamento não somente devido as diversas origens das populações cultivadas e exploradas de caju, mas tambem a provável cruzamento entre populações de cajuí e caju. A comparação geográfica das populacões oferece evidências, embora não muito robustas, para um padrão de correlação entre morfologia e geografia. Conclui-se, portanto, que este estudo não oferece apoio robusto para a hipótese de duas espécies diferentes, e sim para uma hipótese alternativa, que cajuí pode ser um taxon infra-específica de A. occidentale.
Palavras-chaves: Anacardium occidentale, Anacardium microcarpum, caju, cajuí, morfometria, taxonomia.