A cólera é uma doença infecciosa aguda causada pela bactéria Vibrio cholerae, que se multiplica rapidamente no intestino humano produzindo uma toxina chamada de toxina da cólera (TC) causadora de uma diarreia aguda intensa. A TC provoca uma ativação excessiva da adenilato ciclase nas células epiteliais intestinais e consequentemente um aumento dos níveis intracelulares de AMPc, que culmina com a secreção excessiva de Cle água para o lúmen intestinal. O V. cholerae também pode estimular uma modesta resposta inflamatória intestinal e ativação do sistema nervoso entérico, fatores que também contribuem para a fisiopatologia da cólera. A solução de reidratação oral (SRO) que consiste numa mistura simples de sais e glicose em proporções específicas é o método mais eficaz para o tratamento da cólera. Apesar de combater a desidratação, a eficácia da SRO é limitada. Assim, a busca por moléculas antissecretórias para o tratamento da cólera pode ser eficaz quando a SRO não está disponível, sendo que moléculas antissecretórias podem potencializar a eficácia da SRO. Nesse sentido, objetivouse efetuar um levantamento científico, no capítulo I, no formato de revisão de literatura sobre as principais moléculas em estudo para o tratamento da cólera, bem como discutir os principais alvos moleculares destas. O H2S representa uma dessas moléculas com potencial terapêutico, porém com mecanismo de ação ainda por esclarecer. Assim, no capítulo II foi realizado um estudo in vivo com moléculas doadoras de H2S, NaHS e GYY 4137 na diarreia induzida pela TC no modelo de alça intestinal isolada em camundongos swiss para melhor avaliar seus efeitos. Para estudar o papel dos receptores EP2 e EP4 de prostaglandina E2 (PGE2) no efeito antissecretório do H2S, foram usados PAG (DL-propargilglicina), PF-04418948 (antagonista EP2) e ONO-AE3-208 (antagonista EP4). Quatro horas após a indução da diarreia pela TC foram avaliados os níveis de secreção intestinal. Além disso amostras teciduas foram retiradas para análise da relação da profundidade das vilosidades e criptas intestinais e expressão de genes inflamatórios e anti-inflamatórios; bem como do transportador de serotonina (SERT) pela técnica de PCR em tempo real. O H2S restaurou a relação da profundidade vilosidade/cripta causada pela toxina da cólera. Para os inibidores de NF-κB, o tratamento com NaHS e GYY 4137 aumentou a expressão de NF-κB1 e para o gene NF-κBIA, apenas o tratamento com GYY 4137 aumentou a expressão desse gene. A TC não alterou a expressão do gene SLC6A4. No entanto, o tratamento com NaHS reduziu sua expressão. O pré-tratamento com PAG reverteu o efeito protetor de PF-04418948 e ONO-AE3-208. Nossos resultados apontam para uma atividade protetora do H2S contra a toxina da cólera por promover uma proteção da morfologia das vilosidades e criptas intestinais e seu mecanismo ocorre pelo menos em parte devido à diminuição da atividade de NF-κB e PGE2. Dessa forma, este estudo mostra a relevância da atividade antidiarreica H2S, e indica que drogas doadoras de H2S são candidatas promissores para a terapia da cólera. Outra molécula descrita na literatura com potencial antissecretório em modelo de diarreia induzida pela TC é a goma do cajueiro (GC). Essa goma consiste em um heteropolissacarídeo complexo extraído do exsudato do cajueiro Anacardium occidentale L. A GC é um polissacarídeo estericamente grande, com alto peso molecular, dessa forma é provável que essa Goma possa estar se ligando através de porções específicas em suas ramificações diretamente com receptores nas superfícies das células da mucosa intestinal, a TC ou ao muco intestinal. Sendo assim, no capítulo III foi realizado estudo in silico tendo como objetivo selecionar porções de goma de cajueiro: monossacarídeo de galactose, monossacarídeo de ácido glicurônico, dissacarídeo de galactose e um trissacarídeo de galactose e avaliar suas afinidades de ligação com alvos importantes na fisiopatologia da cólera usando AUTODOCK. Para alguns alvos há uma interação maior, com destaque para o ácido glicurônico, que apresentou uma maior força de ligação ao canal CFTR e a diglactose com uma segunda maior energia de ligação com a subunidade A1 ativa da toxina da cólera. Este trabalho nos mostra o perfil de porções específicas presentes na estrutura da goma de cajueiro, que podem ter uma futura aplicação in vivo ou serem utilizadas em combinação com outras abordagens terapêuticas para o tratamento de pacientes com cólera.