A retocolite ulcerativa (RCU) é uma condição inflamatória crônica e remitente do trato gastrointestinal que causa prejuízo na qualidade de vida e na atividade laboral, bem como é preditora de câncer colorretal. Os sistemas endógenos muscarínico e canabinoide regulam a homeostase intestinal e apresentam ação anti-inflamatória em modelos experimentais de colite. Além disso, evidências crescentes na literatura apontam a interação entre essas vias em diferentes regiões, como hipocampo, cerebelo, córtex pré-frontal e no intestino delgado. Com base nesses achados, e considerando que a ativação de receptores muscarínicos estimula a produção de endocanabinoides no intestino, o presente estudo teve como objetivo investigar o envolvimento do sistema endocanabinoide na redução dos danos intestinais mediado pelo receptor muscarínico M1 em camundongos. Neste trabalho, utilizou-se camundongos swiss machos (25–30 g), divididos em grupos de 6 animais. Inicialmente, a colite foi induzida por ácido acético a 6% e os camundongos foram tratados com McN-A-343 (agonista muscarínico M1) 1,5 mg/kg intraperitoneal (ip.) ou dexametasona (DEXA; 2,0 mg/kg) subcutânea (s.c.) com 17 h ou 17:30 h após a indução da colite, respectivamente. Os antagonistas dos receptores canabinoides CB1 e CB2, respectivamente, AM251 (3,0 mg/kg, ip.) e AM630 (1,0 mg/kg, ip.) foram administrados 30 minutos antes do tratamento com McN-A-343 e o dimetilsulfóxido (DMSO; 4%, ip.) no mesmo horário dos antagonistas canabinoides. Após 18 h da indução da colite, 5 cm da parte distal do cólon dos animais foram removidos para análise dos escores macroscópicos e microscópicos de lesão, peso úmido colônico e dosagens bioquímicas da atividade da mieloperoxidase (MPO), concentrações de malondialdeído (MDA), glutationa (GSH), nitrato/nitrito (NO3/NO2) , citocinas fator de necrose tumoral alfa (TNF-𝛼) e interleucina 1 beta (IL-1β). Os experimentos foram aprovados pela Comissão de Ética-UFPI n°006/19. Ademais, foram realizados ensaios de docagem molecular do McN-A-343 com os receptores canabinoides CB1 e CB2, assim como do endocanabinoide, 2-araquidonoilglicerol (2- AG) com o receptor muscarínico M1. Nos ensaios in vivo a administração de AM251 ou AM630 previamente ao tratamento com o McN-A-343 bloqueou significativamente à resposta anti-inflamatória mediada pelo agonista M1, o que se comprovou pela acentuação do dano intestinal, aumento do peso úmido, da atividade da MPO, da concentração de citocinas pró-inflamatórias e dos marcadores de estresse oxidativo. Os resultados de docagem molecular do McN-A-343 com receptores CB1 e CB2 apresentaram energia de ligação de -8,11 kcal.mol-1 e -6,25 kcal.mol-1 e constante de inibição de 1,14 μM e 26,41 μM, respectivamente, bem como interações hidrofóbicas, sugerindo assim que houve interação entre as moléculas, e que a energia de ligação foi mais forte entre o agonista M1 com o receptor CB1, do que com o receptor CB2. Ainda foi observada uma alta afinidade molecular do 2-AG com o sítio ativo do receptor muscarínico M1, com energia de ligação de -8,71 kcal.mol-1 , constante de inibição de 414,63 μM, uma ligação por ponte de hidrogênio e interações hidrofóbicas. Com base nesses resultados, sugere-se que os constituintes do sistema endocanabinoide como o 2- AG e os receptores canabinoides CB1 e CB2 estão envolvidos na ação anti-inflamatória periférica do sistema muscarínico no curso da colite induzida experimentalmente. Portanto, a modulação dessas vias farmacológicas pode apresentar um potencial promissor para o tratamento de condições inflamatórias intestinais.