No tocante à sua textualidade e quanto à discursidade sobre os modos de ler e produzir o texto dissertativo, o Enem vem se renovando a cada edição. Para sua realização são disponibilizadas versões do Guia/Cartilha do Participante, a fim de orientar o sujeito candidato para realização da prova de redação. Desta materialidade, emanam efeitos que transbordam, em uma tentativa da Instituição Inep de administrar os sentidos acerca do texto dissertativo-argumentativo. Com a (re)formulação das Guias/Cartilhas a cada edição do Exame, tem-se o novo textualizado no interior do já-conhecido; há assim deslocamentos no modo de se perceber o processo de leitura e escrita dos textos dissertativos. Nesse sentido, analisamos o modo como os dizeres do Inep sobre o texto dissertativo-argumentativo no Enem, a partir de exemplares das Guias/Cartilhas do Participante, (pode) reverbera(r) em efeitos no material didático de língua portuguesa do EM, uma vez que o processo de discursivização do Inep sobre o texto dissertativo-argumentativo (pode) leva(r) à constituição das condições de produção do trabalho com esse texto na escola. Para tanto, subsidiados no viés discursivo da linguagem, tomamos como base a AD Materialista proposta por Michel Pêcheux e desenvolvida por Eni Orlandi no Brasil, para compreendermos os efeitos desse discurso do Inep sobre o texto dissertativo nos livros didáticos de Língua Portuguesa do Ensino Médio. Para isso, selecionamos como arquivo desta pesquisa nove livros da coleção “Português: Linguagens” do Ensino Médio, da Editora Saraiva, e os exemplares das Guias/Cartilhas do Participante disponibilizados no site http://portal.inep.gov.br/web/guest/enem- outros-documentos. Trabalhamos, portanto, com essas materialidades linguísticas e suas implicações na ordem do simbólico, através do mecanismo da interpretação, tendo em vista que a exterioridade dos fatos é analisada sob o viés do real, da incompletude, a partir de um contexto sócio-histórico-ideológico. Como resultado de nossas análises, depreendemos que o Inep produz, em seu gesto de autoria acerca do texto dissertativo-argumentativo no Enem, um dizer ‘legitimado’, ‘sedimentado’ através das Guias/Cartilhas do Participante. Esse dizer provoca efeitos nos livros didáticos de Língua Portuguesa da Coleção Português: linguagens. Todavia, há pontos de deriva quanto à formulação do texto dissertativo no livro didático, visto que, apesar de atravessado pelos dizeres do Inep sobre a dissertação no Enem, nos livros didáticos analisados não há menção às Guias/ Cartilhas. O que há é um discurso sobre a preparação do sujeito aluno para as provas do Enem e de vestibulares, que tocam o já-dito pelo Inep nas Guias/Cartilhas do Participante. Ademais, o discurso do Inep não se configura como condições de produção para um modo específico de significar o texto dissertativo nos livros didáticos, e os dizeres do Inep sobre o texto dissertativo-argumentativo (possivelmente) não provocam mudanças quanto à abordagem que se dá no tratamento com o texto dissertativo-argumentativo na sala de aula. Contudo, em algumas sequências discursivas, o LD aparece como efeito-leitor da produção do Inep sobre o texto dissertativo, mas não com regularidade.