NARRATIVA DE FUNDO SOCIAL COM (IM)PERFEIÇÕES ESTILÍSTICAS NA FORMA PSICOLÓGICA: um estudo bourdieusiano da engenhosidade híbrida de Graciliano Ramos em Angústia
Campo de produção cultural. Habitus. Poder. Angústia. Graciliano Ramos. Pierre Bourdieu.
O romance nordestino de 1930, que imprimiu uma nova linha ao movimento de 1922, deu à literatura um caráter de testemunho que muito se aproxima do documentário social. Sendo assim, a safra de obras de ficção desse período traduz o nordeste como uma região que, além de ser assolada pelas intempéries do sertão, sofre com as desigualdades sociais e com a truculência do regime político e impõe, dessa maneira, um aparentemente incessante silenciamento dos intelectuais. Nesse contexto surge Angústia, terceiro romance de Graciliano Ramos e o único urbano, publicado em 1936, quando seu autor ainda estava preso. Esse romance sempre foi analisado como genuinamente psicológico, até mesmo pelos críticos mais abalizados, como Antonio Candido. Percebendo essa deficiência na fortuna crítica, a presente dissertação propõe, pois, uma discussão acerca do caráter social de Angústia a partir dos conceitos de campo de produção cultural, habitus, poder e projeto criativo – todos oriundos da sociologia de Pierre Bourdieu. Assim procedendo, chega-se à constatação de que, com Angústia, Graciliano Ramos pretendeu elucidar aos seus leitores tanto a situação psicológica de Luís da Silva, como as múltiplas conexões do personagem com os problemas sociais de sua época. A pesquisa também observa que, além da complexa descrição psicossocial de Luís da Silva, Graciliano Ramos, na condição do mais expressivo romancista brasileiro naqueles tempos sombrios, reproduz de forma rigorosa o campo do poder e as disputas de classe na Maceió dos anos 1930, representados no romance pelo trágico triângulo amoroso: Julião Tavares X Marina X Luís da Silva. Para tal averiguação, toma-se como ponto de partida uma minuciosa releitura de Angústia, observando tanto seu contexto sócio-histórico, como seus aspectos estruturais, destacando os eventos sociais em vários pontos de confluência entre o psicológico e o social da narrativa. Ao lado disso, procura-se revelar mais amiúde os discursos sobre as inquietações políticas e literárias do e no cenário brasileiro da época. Assim, o presente estudo confirma que o terceiro romance de Ramos também é social, assim como igualmente reconsidera seu fator psicológico apenas como de importância secundária e enfatiza seu potencial híbrido.