O objetivo geral da pesquisa é investigar a carnavalização, compreendida como processo amplamente arraigado na cultura popular, marcado pela presença de costumes, crenças e personagens provenientes tanto do campo mítico como do contexto sócio-histórico, em que a hierarquia e estruturas de poder vigentes são abolidas ou investidas, apresentando como corpus de investigação o texto dramático Auto do Lampião no além (1999), do piauiense Gomes Campos. De forma mais específica, observar o processo de carnavalização decorrente da polifonia presente no texto, uma vez que através das diversas vozes apontadas na narrativa o autor apresenta o conflituoso, o contraditório, ressaltando cenas em que as personagens colocam as suas condições físicas e sociais, o que, por vezes, pode ser percebido nas características onomásticas dos próprios nomes dessas personagens, que evidenciam características sintomáticas do drama; examinar no processo de carnavalização as situações em que acontecem a inversão da ordem, a troca de papeis ou a subversão das estruturas de poder, assim como o destravestimento em relação a posturas de personagens que se desnudam e, assim, expõem seus pontos fracos; avaliar a carnavalização proveniente da intertextualidade presente na peça, em que textos e fatos históricos são parodizados, através de uma linguagem simples, popular e coloquial, fomentando, assim, uma forte crítica social. Para a constituição da base teórica do trabalho, apela-se para Biderman (1998), Dick (1992), Jimenez Segura (2014), Fiorin (1999), Brait (1996), Durkheim (1996), Eliade (1992), Meyerhold (1992), Minois (2003), Bergson (1980), Durkheim (1996), Schwartzenberg (1977),Silva (2000), Foucault (1999), Hutcheon (1985), para a compreensão do fenômeno social do carnaval e do conceito de carnavalização; Bakhtin (1987, 1997) e Kristeva (2012), para a compreensão dos conceitos de polifonia, dialogismo e intertextualidade. Auto do Lampião no além de Gomes Campos, peça teatral com tema popular e abordagens histórico, social e religiosa, mostra personagens e situações em que estão contidas as mais diversas características carnavalizadoras. Percebe-se a inversão da ordem, em que os episódios e personagens satirizados tomam a “tribuna” do palco, apresentando uma visão caricata de um Brasil não muito “sério”, revelando conflitos entre a ordem oficial e a popular. O mundo dos infernos seria nada mais nem nada menos que uma projeção do mundo terreno; as situações e comportamentos das figuras que desfilam pelo gabinete de Lúcifer são carregadas de características carnavalizadoras, ou seja, remete-nos a uma visão parodística do mundo.