João Cabral de Melo Neto sempre se manteve fiel ao seu projeto poético, dedicando-se a compor, pelo rigor da construção consciente, uma obra caracterizada por um discurso objetivo, de inspiração concretista. Por este esforço, recebeu o título de engenheiro da linguagem. Atenta ao rigor empreendido pelo poeta, a fortuna crítica tem lido a obra cabralina pelo que ela apresenta de matéria lógica e formal. Embora completos 100 anos de nascimento de João Cabral, a categoria espacial tem sido negligenciada, por não haver pesquisas amparadas em teorias próprias do espaço ficcional. Nesse sentido, busca-se, neste trabalho, situar e examinar a poética de João Cabral à luz de uma teoria do espaço. Pela análise do fator crítico que o poeta incumbiu à sua poesia, esta pesquisa é orientada pela premissa de que João Cabral explora pelo espaço a interface modernização-tradição impregnada na linguagem e na sociedade; essa tradição, como contraste da modernidade, ajuda a compor a imagem da exploração e da pobreza que perduram na sociedade brasileira, como um jogo político. Assim, objetiva-se investigar os mecanismos de produção do espaço na obra de João Cabral de Melo Neto a partir de uma perspectiva política e social. A metodologia parte de uma revisão bibliográfica de cunho exploratório, examinando, junto à teoria, como é que o poeta estrutura na lógica espacial de sua poética a configuração política e social. Para se alcançar esse objetivo, o trabalho apoia-se nas teorias que versam sobre espaço ficcional e manifestações de poder político dentro da literatura em relação às suas representações sociais, também em relação a literatura como objeto próprio de manifestação estético-político, não obstante como um espaço para essa manifestação. Para entendimento da categoria do espaço, a pesquisa foi direcionada por Brandão (2013), Brandão Santos e Oliveira (2001), Massagli (2015), Tuan (2013), entre outros. Para se discutir a interação entre espaço, sociedade e política, valeu-se principalmente de Lefebvre (2016a, 2016b). Das leituras da obra com o marco teórico supracitado, se reconhece espaços nacionais e internacionais manipulados por suas bases discursivas-ideológicas de poder e domínio. O poeta recifense dá a ver e compreender como a poesia brasileira e o que nela se diz/desdiz formam as concepções de mundo, bem como as concepções acerca deste lugar brasileiro no mundo.